Antro Particular

28 fevereiro 2009

adeus iraque

31 de agosto de 2010.
O mundo mudará outra vez.
Já escrevi aqui que 11 de setembro foi para mim a entrada no século 21 para a história. Tanto quanto a explosão da crise americana para o resto do mundo, a entrada para o novo século na economia.
Obama agora anuncia: 31 de agosto de 2010! Guardemos a data como a entrada no nosso século na forma de fazer política.
uma silenciosa felicidade me toma...

27 fevereiro 2009

obama, gerald e eu...

Comentário publicado originalmente no blog de Gerald Thomas, dia 25 de fevereiro.

Dormia sem culpa quando acordei com a voz de Obama no globonews. Sim, tenho dormido com a tevê ligada em canais políticos. Não consigo mais me desvencilhar disso. Tornou-se um vício e, como todo vício, tenho certeza de não me fazer bem. Levanto cansado, como que sugado pelos ouvidos, reagente a enxurrada de notícias ruins que me invadem o sono. Não há tempo para pesadelos. E nada é mais impressionante do que sonhar com a realidade em momento real. Ouvi a voz de Obama e simplesmente acordei.

A fala de Obama a senadores e congressistas conduzia-me a uma espécie de delírio eufórico, misturando satisfação e concordância ao receio e inveja. Sim, também me assustei diversas vezes com o tom ditatorial. Assustei-me ainda mais ao perceber que o aceitava como algo precioso. Algo brilhava ao escutá-lo afirmar a saída do Iraque, desativação de Guantánamo, a valorização da educação, investimentos para gerar novos vocabulários tecnológicos. Algo se sombreava ao perceber a voracidade com que expunha idéias tão próximas as minhas crenças.

A inveja era inevitável, portanto. Como gostaria de ouvir nossos representantes em colocações lúcidas, sem mesquinharia politqueiras de manipulação eleitoral na superficialidade mais banal do simplório objetivo do voto e da manutenção de seus pequenos poderes. Pequenos, sim. Quantos deles, espalhados em todo tipo de cadeiras e alturas, não simplificam a realização de seus poderes pela mediocridade do enriquecimento? Chega a ser constrangedor. A inveja se prostrava a um discurso planejado e exposto com perspicácia, conhecimento, cultura. Nunca estaremos preparados para nossos Obamas ou quaisquer outros. Permanecemos subestimados aos intermediários populistas – sejam cultos ou ignorantes, burgueses ou proletários.

Por aqui, o carnaval estabelece bem a simplicidade de nossas expectativas. Foi-se janeiro há pouco mais de um mês, e comemoramos como os últimos dias de vida, os novos feriados. Atravessar a rua nos torna macunaimamente cansados. Olhar por além dos edifícios chega a dar torcicolos. E limitamos o horizonte a calçada da frente, quebrada, abandonada, mas possivelmente acessível sem muito esforço.

Nunca aprenderemos a aprender com a história. Nunca levaremos o Municipal ao Municipal. Pois não nos interessa constituir nada. O Brasil é assim. A rede, o ventilador, a maresia, o chopp, a caipirinha, a feijoada, o churrasco, a roda de pagode, as escolas de samba, os programas de auditório, as novelas, as celebridade e suas bundas e bundas anônimas, e bundas em revistas, e capas com bundas, e músicas sobre bundas, e turistas e seus cliques digitais de bundas, e as prostitutas, e as crianças prostitutas, e as crianças das prostitutas sem pais, sem mães, sem país, e os filhos do país sem pais, e os pais do país, e os donos, e os escravos, e os mortos de ontem, e os mortos vivos que nos tornamos a cada feriado e a cada novela e cada político e a cada churrasco e a cada dia.

Ainda guardo o receio do tom ditatorial de Obama.

Beijos, querido.
RUY FILHO

25 fevereiro 2009

ESTA SEMANA TEM...

O carnaval passou. Nós continuamos.
Nesta quarta e quinta, as 22h30,
no espaço dos Satyros 2.

19 fevereiro 2009

o brasil que o lula não vê

20% é a proporção de aumento de cheques sem fundo no último mês. entramos na fase de não pagamento das dívidas pessoais, essas pequenas do dia-a-dia. como escrevi e como praticamente todos pelo mundo afora avisaram. apenas lula acha que as coisas caminham para uma resolução. próximo passo, fatalmente, como a história recente tem mostrado, é o não cumprimento dos títulos e o endividamento dos bancos frente aos créditos não pagos. ainda que os lucros bancários nesse último trimestre tenha sido recorde.

seguindo









desde algumas semanas, a cia. de teatro antro exposto tem se reunido no centro cultural rio verde para a construção do novo espetáculo. desta vez, com texto de priscila nicolielo e participação de todo o elenco. são sessões de cinema, vídeo-arte, literatura, filosofia, pipoca e vinho. ainda para este ano... a cia. não para mais. as fotos são de patrícia cividanes.

17 fevereiro 2009

venezuelanas

E deu o que deu. Tracaram as portas da Venezuela com as Chaves dentro. Não há maçaneta do lado de fora.

15 fevereiro 2009

ainda sobre o ego...

Três bons comentários foram enviados ao meu artigo sobre o ego do artista. Thomaz, Abelha e Helen, voltarei a vocês amanhã...

13 fevereiro 2009

Festival de Curitiba

07 fevereiro 2009

lá vamos nós...

Um telefonema de um amigo, um convite e uma boa conversa. Vem mais por aí para a Cia. de Teatro Antro Exposto. Pena Patrick Grant estar em casa...

06 fevereiro 2009

estranhamente particular

O grupo de elásticos que deveria ser solto ordenadamente, de maneira a atingir seus pontos de fixação espalhados por todo o teatro, se confunde entre o braço da atriz e percurso, embaralha-se, e à violência do movimento linear previsto vê o perigoso emaranhado voltar-se para uma direção imprevista. Entre o novo caminho e o repouso, uma lâmpada fria é rasgada ao meio. O som de explosão. Pedaços. O linóleo preto maculado pela fina poeira branca que compunha a luminescência.

Dito assim, a cena mais parece a descrição de um vídeo provocado. Nada disso. A explosão da lâmpada ao ataque dos elásticos, na passada apresentação de Complexo Sistema de Enfraquecimento da Sensibilidade, deu ao espetáculo outro tom. Ganhou perigo real, de risco físico. Atores nervosos, público assutado, improvisações no restante do desenho de luz. Ainda estávamos a poucos minutos do início.

O que mais me fascina no teatro é a imprevisibilidade. Do ator à cena, da dramaturgia ao público. Hoje, quinta, os atores foram ao máximo para dar ao espetáculo sua magia. Em um dia especialmente estranho, a emoção ao fim traduzia a vontade de abraçar cada um. A voz embargada, os olhos marejados. Sei que agradeci ali mesmo, em público. Só que não bastara. E continuo, agora em meu quarto, a lembrar cada segundo, cada um dos rostos. Seria impossível dormir sem antes agradecer novamente a Diego, Gabi, Giu, Guilherme, Raí e Tiago. E também Priscila e sempre minha Patrícia.

Obrigado a todos e parabéns pelo espetáculo impecável. Eternamente, obrigado...

02 fevereiro 2009

novas fotos

Complexo Sistema de Enfraquecimento da Sensibilidade ganha novas fotos. Melhor... Recebe o olhar poético de Lenise Pinheiro. Fotos para serem vistas e sentidas em silêncio enquanto é redescoberta a arte. obrigado, Lenise.
As imagens estão disponíveis no blog Cacilda.

CSES por César Ribeiro

COMPLEXO SISTEMA DE ENFRAQUECIMENTO DA SENSIBILIDADE ou JOGUETES DE NÓS MESMOS

Grande parte dos artistas aposta em seguir regras determinadas que lhes deem a impressão de que seus trabalhos serão colocados na roda ou se perpetuarão nela, optando por tentar fazer bem-feito um modelo copiado e recopiado e recopiado ao infinito. Alguns poucos artistas preferem criar uma linha particular de procura de significados éticos e estéticos, e nesse risco podem se deparar com erros no percurso e na execução. De qualquer maneira, tendo a sempre preferir uma arte do risco que tenha suas imperfeições a uma arte perfeita que aposte no lugar-comum. Mesmo porque essas ditas imperfeições na verdade não são do criador, e sim do espectador, que ao estar diante de algo pouco convencional pode não apreciar determinadas soluções. Afinal, ao contrário da arte usual, a real criação pede um novo olhar do público, exige uma atenção diferenciada para compreender os códigos emitidos... Ou seja, exige um público inteligente. E com inteligência não estou me referindo àquela das escolas, das academias etc., pois esta não tem nada a ver com inteligência, e sim com conhecimento de informações oficializadas.

Bom, todo esse blábláblá para falar de Complexo Sistema de Enfraquecimento da Sensibilidade, peça escrita e dirigida por Ruy Filho que está em cartaz no Satyros 2. Há muito que falar de uma encenação como essa, mesmo porque o estilo de pesquisa colocado no palco segue os mesmos princípios das peças que faço, com soluções estéticas muito diferentes. Não sei se há uma influência proposital ou ela surge apenas porque muitas delas nos assolam sem que tenhamos consciência ou porque essas influências são na verdade minhas, mas há muito na peça do Ruy das buscas de Gerald Thomas e muito também da franquia cinematográfica Jogos Mortais — sou fã declarado de ambos.

A base da peça é o jogo dominador/dominado, com papéis claros que se misturam às vezes, e a peça se desenvolve como um jogo em que o dominador transfere a sua capacidade de domínio para o dominado, fazendo dele um novo possível companheiro de “trabalho”. Sim, de trabalho, a oficialização da imposição. Um marco desse curso montado em cena para compartilhar o ofício de dominador está na ideia de que o dominado não tem rosto, representando uma multidão, enquanto o dominador exibe sua face em detalhes. O dominado usa sempre uma máscara. Quase sempre. Quando o jogo está perto do fim, quando o curso de enfraquecimento da individualidade está perto do fim (símbolo da morte), o dominado ganha um rosto. A morte revelando a face. Mas essa face desmascarada pela “morte” não tem nada de romântica: é a igualdade, ou quase igualdade, do exercício do poder que lhe dá nome, que permite que o rosto seja revelado. Após essa revelação, ambos duelam no mesmo patamar, ou quase no mesmo patamar, com os papéis se invertendo em alguns momentos. Mesmo porque se o dominador exerce seu domínio sobre o dominado, acima do dominador há outro, superior, que torna o dominador um dominado, fazendo com que todos sejamos joguetes de nós mesmos. Da mesma forma há a ideia Hannah Arendt da responsabilização do dominado por de certa forma querer seu dominador, que lhe eximirá da responsabilidade da opção.

Essa é a base que vejo na ligação do trabalho de Ruy com o de Gerald Thomas, lembrando que, apesar de suas similaridades, é outro trabalho, que em nada copia Gerald, mas segue alguns princípios que ele usa e que muitos outros deveriam seguir. Nas obras de Gerald há sempre a figura do interventor, a voz “divina” que a tudo vigia, que observa todos os passos e muitas vezes os controla, que ri da própria e patética criação. Na peça do Ruy esse interventor também está metaforicamente presente, como se todos fossem peças de uma engrenagem da qual ninguém lembra a origem... mas que deve continuar funcionando.

Já em relação a Jogos Mortais a base é a própria relação dominador/dominado montada como um quebra-cabeça que vai se unindo aos poucos diante do olhar do público. Tudo isso em um ambiente metálico, uma espécie de Trilogia Cubo (também duca). Os jogos são armados, as relações são criadas, os objetos ganham e perdem seu sentido, refazem-se diante dos olhos do espectador. Aliás, se há uma crítica negativa que posso fazer em relação à peça é exatamente que, em vez de as cenas irem se construindo gradativamente no palco, elas são interrompidas para que o espaço cênico se recrie. Mas, como disse anteriormente, essa é uma opção do diretor, é intencional. O que quer dizer que, se eu não gostei, azar o meu.

Independentemente de eu não achar necessárias essas interrupções para recomposição do espaço, quando ele se recria a cena ganha novos interesses: o ambiente metalizado é reconfigurado, o constante estalar das cadeiras caindo, as cadeiras de rodas beckettianas, as rodas de Duchamp, as máscaras de Magritte... tudo levando aos mortos, aos desaparecidos, aos tomados no meio do percurso para serem "reeducados". Ou seja, os integrantes do Cubo deparando-se com novas prisões e novas (des)esperanças. Se é que há realmente a espera. Quanto à tão mencionada trilha sonora de Patrick Grant, confesso que vejo duas linhas distintas apesar da ideia criativa ser a mesma: na primeira metade da peça ela apela muito para o suspense, para variações melódicas, para uma desconstrução sonora estridente que por muitas vezes não soa interessante no duelo com o que acontece em cena (manja Tubarão? Não o mote conhecido, mas a extensão dele. Ou, para ser menos pop, Alphaville); na segunda parte ela lida com a repetição, e o faz muito bem. Essa opção utilizada no longo diálogo entre os personagens centrais funciona exatamente pela não variação da linha melódica. Mas, como disse antes, isso é pura e simplesmente uma questão de gosto.

O fato prático é que realmente não interessa que você goste ou não da peça, isso é o de menos. O importante é que ela DEVE ser vista, exatamente por se tratar de um trabalho em que há forte assinatura de seus criadores, em que se aposta na fundação de uma linguagem própria, sem cair nas regrinhas do tipo "como fazer sua família, da vovozinha ao papagaio, bancar os cem contos do ingresso e assistir à peça e aplaudir no final e comer pizza no Bar Mais Perto?"

SEM EGO, O ARTISTA ESTÁ FADADO AO DESAPARECIMENTO

Tenho lido muita coisa do filósofo alemão Jügen Habermas e sua contribuição sobre teoria da Ação Comunicativa. Por ser ele sociólogo também, juntei, aos estudos e ensaios, muita reflexão filosófica associada a um alto teor de preocupação social. Segundo Habermas, a democracia nada mais é do que o fim e meio da emancipação individual e social, estando na nossa capacidade em nos examinarmos por conversas e diálogos os instrumentos para alcançarmos autonomia de julgamento sobre os fatos e assim chegarmos a liberdade.

O que tenho percebido no discurso comunicativo de jovens artistas e outros nem tão novos, é o despojamento do próprio ego. Explico: a necessidade de reconhecimento imediatista, disponibilizado pelas mídias mais superficiais, conduziu os artistas à construção de uma persona que satisfaça os interesses externos, em detrimento aos seus anseios reais. Não se trata de simplificar a questão pela venda ou submissão. Vamos mais longe sobre isso...

Optar ser artista é acreditar ter a capacidade de gerar discursos, cuja verdade inicial, portanto individual e própria, serve a todos como lhe serve, que seus argumentos e percepções são verdadeiramente necessários para levar o público (alienado ou ausente ou incapaz ou meramente desinteressado, tanto faz) a conhecer o que lhe escapa sobre a humanidade e a história, em si mesmo e os acontecimentos.

Valorizar, portanto, sua egolatria, significa dar profundidade e credibilidade a suas inquietações tornando-as diálogos sinceros e próprios ao coletivo democrático imaginado por Habermas. Em nenhuma outra profissão ou função social poderemos nos atribuir a capacidade em ser divergentes da verdade. Um advogado prostra-se aos fundamentos da Lei, um médico aos procedimentos, um engenheiro à precisão do cálculo. O artista a ninguém, contudo. Apenas a si mesmo e suas idiossincrasias para gerar pressupostos filosóficos e estéticos. Por isso é fundamental sua crença na onipotência de seu discurso.

Infelizmente, como mencionei, a vaidade ególatra dos artistas atuais está mais na busca por sua aceitação e reconhecimento público do que necessariamente em sua capacidade em ser um indivíduo, em ser único. E aí reside a problemática em si. Sem sua individualização e separação do coletivo, os discursos oferecidos são replicações de falas comuns, portanto, incapazes de atribuir ao ouvinte as capacidades próprias do diálogo e da ação comunicativa.

Se, como demonstra Habermas, a comunicação e a palavra são os principais instrumentos para constituir a democracia, e se nossos artistas (parâmetros comportamentais e de idéias estabelecidos pelas mídias) estão cada vez mais distantes da verdade de suas inquietações, caminhamos, então, para a elaboração de uma sociedade vazia de diálogos e discursos. Dessa maneira, o artista, hoje, serve mais à destruição da comunicação do que ao seu avanço e leva a arte a ser, dentre tantas outras manifestações do homem, uma das mais ferozes inimigas da construção efetiva de democracia.

Se um artista abandona sua egolatria, tudo aquilo que lhe torna realmente artista, em nome da noção efêmera e errônea de pertencimento, traduzindo seu trabalho em explanações do superficialismo do bem-comum coletivo, por que eu deveria levá-lo a sério?

Artista é aquele que simplesmente caminha, sem olhar ao lado, sem preocupar-se com o abraço e aplauso, e incomodamente abusivo no olhar olhos desconhecidos.