O CÉU CINCO MINUTOS ANTES DA TEMPESTADE: criamos nossas próprias tempestades
Quando em 1999, Antunes Filho abriu o Centro de Pesquisa Teatral para o desenvolvimento e formação de novos dramaturgos, deu início ao processo, há muito diagnosticado pelo diretor, de serem necessários novos escritores para formar uma outra geração de intérpretes. O Céu Cinco Minutos Antes da Tempestade, dá palavra e voz a esse anseio, após o sucesso de O Canto de Gregório. Ambos os textos, frutos do Círculo de Dramaturgia do CPT.
O texto recente coube a Silvia Gomes, em montagem dirigida por Eric Lenate, com atores do próprio núcleo: Carlos Morelli, Patrícia Carvalho, Paula Arruda e Adriano Petermann. Por cerca de 50 minutos, deparamos com uma verborragia cuja falta de argumentação leva as personagens a sucessões de dizeres ora desnecessários, ora patéticos. Mas é disso que trata a peça, dessa falta de comunicação, da perda de nossa capacidade em nos relacionarmos, em termos o que falar. E, nesse universo, Silvia Gomes recria, pela desconstrução do sentido familiar – pai, mãe e filha – uma ambiência beckettiana, conduzida pela direção e caricaturas expressionistas de intensificação sobretudo dos olhos e gestos.
Entretanto, falta um pouco mais de aprofundamento da personagem masculina, o pai, figura responsável pelo desmantelamento do seio familiar e que na narrativa permanece à deriva da problemática, coadjuvando a cena para os solos da filha. O drama se banaliza ao se propor discutir as impossibilidades de reencontro entre os personagens, e acaba por deixar
certo sabor de obviedade, sem muitas outras camadas. Escrever sobre os silêncios e ausências de entendimentos, ainda que por seu oposto (falatório desmedido sem escuta e diálogo), pode ser mais do que simplesmente retratar nossa falta de comunicação. De alguma maneira, a peça parece tentar resolver no texto todos os contextos simbólicos, abrindo mão de ser amplamente metafórica e retirando do espectador qualquer diferente interpretação.
A opção de uma direção calcada na expressão corporal-facial ultrapassa a representação pretendida e esbarra em muitos momentos no caricatural circunstancial de cenas, quase sempre, gritadas, sem muita outra finalidade que não um efeito óbvio de traduzir o título em código. Título da peça, aliás, devidamente mencionado integralmente por uma das personagens, conforme nos aconselha as dramaturgias mais tradicionais.
Se a coerência com nossa época é precisa, por outro lado sobra uma questão a ser debatida. O que assistimos nas duas peças provenientes do Círculo de Dramaturgia, são propostas explicitamente alicerçadas nas estéticas e pensamentos de Antunes Filho. Mesma técnica de atuação, estrutura de encenação, uso da voz, escrita, enfim, até certo ponto, nada de muita novidade e ousadia. Ou mais problemático ainda, nada de muito pessoal. É como se revivêssemos o consagrado diretor, travestido de jovens rostos.
Qualquer processo educativo permeia o risco de fundamentar e se limitar às prerrogativas daquele que o conduz. O que percebemos, agora, com O Céu Cinco Minutos Antes da Tempestade, sem a direção direta de Antunes Filho, é de um continuísmo copista da técnica. O que pode vir a ser problemático e incoerente dentro da proposta que motivara e originara a formação do Círculo.
Se não é possível haver novos intérpretes sem novos dramaturgos, conforme afirmara o diretor; se a cena teatral necessita de fato de uma renovação; se vivemos uma época de idolatrias efêmeras e mercantilização do talento traduzindo em superficialidade instantânea – e tudo isso verdadeiramente diagnostica o hoje com corte cirúrgico –, então os espetáculos surgidos dentro do Círculo de Dramaturgia do CPT, avançam em contra-mão às necessidades reais levantadas por eles mesmos.
Na formação de intérpretes, dramaturgos e diretores que se revelam continuistas de uma estética e pensamento de décadas de existência, cujo trabalho desenhara um rosto preciso em nossa cultura, não chegaremos, então, ao surgimento do outro, do próximo ator-dramaturgo. Ao seguirmos precisamente o mestre, valorizando seus fundamentos como verdades estagnadas, estaremos, no máximo, repetindo fórmulas consolidadas, sem muito que acrescentar.
Alguém dissera certa vez: “O problema das novas gerações é que o Antunes, o Zé Celso e Gerald Thomas, são excessivamente respeitados. Sem o devido desrespeito, estaremos fadados à idolatria cega e simplórias imitações”.
O texto recente coube a Silvia Gomes, em montagem dirigida por Eric Lenate, com atores do próprio núcleo: Carlos Morelli, Patrícia Carvalho, Paula Arruda e Adriano Petermann. Por cerca de 50 minutos, deparamos com uma verborragia cuja falta de argumentação leva as personagens a sucessões de dizeres ora desnecessários, ora patéticos. Mas é disso que trata a peça, dessa falta de comunicação, da perda de nossa capacidade em nos relacionarmos, em termos o que falar. E, nesse universo, Silvia Gomes recria, pela desconstrução do sentido familiar – pai, mãe e filha – uma ambiência beckettiana, conduzida pela direção e caricaturas expressionistas de intensificação sobretudo dos olhos e gestos.
Entretanto, falta um pouco mais de aprofundamento da personagem masculina, o pai, figura responsável pelo desmantelamento do seio familiar e que na narrativa permanece à deriva da problemática, coadjuvando a cena para os solos da filha. O drama se banaliza ao se propor discutir as impossibilidades de reencontro entre os personagens, e acaba por deixar
certo sabor de obviedade, sem muitas outras camadas. Escrever sobre os silêncios e ausências de entendimentos, ainda que por seu oposto (falatório desmedido sem escuta e diálogo), pode ser mais do que simplesmente retratar nossa falta de comunicação. De alguma maneira, a peça parece tentar resolver no texto todos os contextos simbólicos, abrindo mão de ser amplamente metafórica e retirando do espectador qualquer diferente interpretação.
A opção de uma direção calcada na expressão corporal-facial ultrapassa a representação pretendida e esbarra em muitos momentos no caricatural circunstancial de cenas, quase sempre, gritadas, sem muita outra finalidade que não um efeito óbvio de traduzir o título em código. Título da peça, aliás, devidamente mencionado integralmente por uma das personagens, conforme nos aconselha as dramaturgias mais tradicionais.
Se a coerência com nossa época é precisa, por outro lado sobra uma questão a ser debatida. O que assistimos nas duas peças provenientes do Círculo de Dramaturgia, são propostas explicitamente alicerçadas nas estéticas e pensamentos de Antunes Filho. Mesma técnica de atuação, estrutura de encenação, uso da voz, escrita, enfim, até certo ponto, nada de muita novidade e ousadia. Ou mais problemático ainda, nada de muito pessoal. É como se revivêssemos o consagrado diretor, travestido de jovens rostos.
Qualquer processo educativo permeia o risco de fundamentar e se limitar às prerrogativas daquele que o conduz. O que percebemos, agora, com O Céu Cinco Minutos Antes da Tempestade, sem a direção direta de Antunes Filho, é de um continuísmo copista da técnica. O que pode vir a ser problemático e incoerente dentro da proposta que motivara e originara a formação do Círculo.
Se não é possível haver novos intérpretes sem novos dramaturgos, conforme afirmara o diretor; se a cena teatral necessita de fato de uma renovação; se vivemos uma época de idolatrias efêmeras e mercantilização do talento traduzindo em superficialidade instantânea – e tudo isso verdadeiramente diagnostica o hoje com corte cirúrgico –, então os espetáculos surgidos dentro do Círculo de Dramaturgia do CPT, avançam em contra-mão às necessidades reais levantadas por eles mesmos.
Na formação de intérpretes, dramaturgos e diretores que se revelam continuistas de uma estética e pensamento de décadas de existência, cujo trabalho desenhara um rosto preciso em nossa cultura, não chegaremos, então, ao surgimento do outro, do próximo ator-dramaturgo. Ao seguirmos precisamente o mestre, valorizando seus fundamentos como verdades estagnadas, estaremos, no máximo, repetindo fórmulas consolidadas, sem muito que acrescentar.
Alguém dissera certa vez: “O problema das novas gerações é que o Antunes, o Zé Celso e Gerald Thomas, são excessivamente respeitados. Sem o devido desrespeito, estaremos fadados à idolatria cega e simplórias imitações”.
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