Antro Particular

20 agosto 2008

TEATRO CULTURA ARTÍSTICA e uma boa conversa...

19/10/2008 - 04:29
Texto enviado ao blog de Gerald Thomas


17 de agosto. São Paulo. E um incêndio de grandes proporções destrói uma das mais tradicionais salas de espetáculos da cidade. O teatro Cultura Artística, emoldurado por belíssimo painel de Di Cavalcanti em sua fachada, arde sem possibilidade de controle, e se vê irmão, na história, de outro dos mais importantes espaços igualmente consumido pelo fogo, o TUCA. Não vivi aquela época. Mas estou vivo agora. E assisto e leio o lamento e revolta genuína por parte dos artistas.

Que nossas salas estão sucateadas, sabemos desde sempre. E aceito a frase que abre o texto de Gerald Thomas em seu blog: “nós somos os responsáveis”.

No entanto, o que adiantará lamentos, revoltas e textos como este? Absolutamente nada. É preciso ir mais radicalmente no âmago da questão e ter coragem de assumir posturas desagradáveis e responsáveis.

Culpamos facilmente os administradores, particulares ou públicos, por permitirem tamanho abandono das salas. Equipamentos sucateados, gambiarras elétricas e gatos por todos os cantos, materiais baratos sem acabamento antichamas. Não sou o artista mais experiente por aí, mas nesses poucos anos, já tampei mesa de luz com minha cabeça para que a goteira não caísse sobre ela, vi refletores despencarem, cabos cederem, e muitos foram os choques em tomadas improvisadas.

Exigir dos gestores melhor tratamento e acompanhamento das necessidades estruturais é o mínimo que cabe aos artistas. Mas apenas isso não resolve nada, pois continuamos ocupando, alugando, aproveitando, apresentando-nos nesses espaços mesmo sabendo de suas impossibilidades em oferecer qualquer segurança mínima aos que dentro do palco trabalham e aos que fora assistem.

Um desastre como o do Cultura Artística serve para nos trazer maior prontidão. A mídia se encarrega de tornar o incêndio uma tragédia. Cabe aos artistas se (re) posicionarem, puxar para si a responsabilidade para que as salas sejam devidamente equipadas e preparadas.

Não está perfeita? Simples, não alugamos, não nos apresentamos, não nos tornamos cúmplices. E talvez seja esse o maior desconforto que acompanha tanta tristeza, a certeza de que nosso silêncio, nossa passividade nos revela cúmplice.

Gerald está certo, somos os responsáveis. Mas quem está disposto a enfrentar verdadeiramente a situação? Desagradar amigos? Encarar parceiros? Conflitar valores?

Faço minha parte recusando. Sempre foi assim. Desde 2000 quando fotografei o porão do Centro Cultural São Paulo e precisei de mais de cem imagens para registrar os problemas. Minha vida custa tanto quanto a dos meus atores e meu público. Sou responsável por eles, sim. Perco espaço por isso e conto com muitos desagravos pelo mundo afora.

Sinceramente? Prefiro ter outros motivos para não dormir.

19/08/2008 - 06:24

Eh isso Ruy! Portugal e suas colonias se indignam! Um ai chega a querer me corrigir no que quer dizer respeito a galharufa, como se eu nao soubesse. Como se nao soubessemos como eh o interior fedorento, humido, coalhado de mofo que sao os camarins, uma vez que o publico saiu, Como se nao soubessemos como eh a disputa por um cadeado pra se trancar alguma coisa, pois as macanetas as portas ja se foram ha muito. Fora os SESCs, sabemos que muitos nem chuveiro tem. E tem gente que acha que, se tem cortina vermelha….eh lindo.

Estou sem conseguir dormir tambem porque:

O fato de ter pegado fogo num teatro imenso ja eh uma coisa terrivel: mas o fato dele se chamar CULTURA ARTISTICA e justamente no Brasil quer dizer muito. Estou lendo muita entrelinha? Acho que sim. Acho que nao.

Viva o Imperio das Meias Verdades

LOVE
G


19/08/2008 - 14:51

As metáforas se consolidam nas entrelinhas, nos nossos subtextos. Não naqueles apresentados ao público, mas exatamente nos camarins sem ar-condicionado, no cheiro que sobe dos porões. Não acho que esteja lendo errado, não.

Cultura Artísitca!! Não é qualquer cultura, é a da arte! Esta, incendiada diariamente pela falta de constância de políticas públicas, por supostos artistas, pelo público desinteressado de reflexão. Só vende-se, hoje, emoção padronizada, artistas padronizados.

Nossos Neros foram décadas de ministérios culturais barganhados nas vésperas de eleições como cadeiras de apoio partidário.

Agora o e a Cultura Artística morrem. Como um fim de tudo isso.

Estamos mais próximos ao olhar silencioso filmado por Bergman em Persona ou ao estupro de Lars von Trier manipulado em Dogville para provocar o julgamento? Entre o sublime e o grotesco, a solidão do artista no brasil é a única verdade concreta. Só precisamos definir se nos tornamos personagens de Bacon ou de Capar Friedrich.

O teatro experimental, a pesquisa artística, a arte em si adornam cada vez os sofás burgueses em salas cafonas. E somos obrigados a viver com isso sem muito que fazer.

em nota: um decisão que não levará a nada! Não escrevo mais brasil com maiúscula. Não enquanto não nos mostrarmos devidamente adultos… metáforas servem para construir simbologias e estas para gerar pardigmas.

beijos, saudades
RUY FILHO

3 Comments:

  • Prezado Ruy,

    sempre falamos isso, mas dificilmente nos posicionamos com a devida coragem. Tememos queimar o filme. Preferimos ver o teatro, o museu, a escola, o hospital, desabarem, do que queimar o filme.

    Dói demais o que se faz com uma pessoa que fala a verdade. Já reclamei de sujeira em Hospital público e quase fui linchado pela própria população: "tá reclamando de que? fica quieto e seja atendido como todo mundo." Para completar, uma balconista disse: "não tem atendimento preferencial em serviço público, querido. Você vai ser atendido como todo mundo." Na sujeira mesmo.

    Não importa se sujo ou limpo, o hospital é o mesmo para todos. Este é o pensamento: do not disturb.

    By Blogger Philosopho, at 12:25 PM  

  • Oi Ruy muito legal o seu blog, não tinha visto ainda.
    To super afim de ir ver entulho.
    senama que vem vou me arrumar pra ir.
    apareço mais por aqui.abração

    By Anonymous Anônimo, at 9:21 AM  

  • Ruy
    Muito bom o seu blog.E sinto pelas suas aflições.Porém, parece que a aflição é inerente aos artistas.Saudades de vc.
    Nilza Amaral

    By Anonymous Anônimo, at 11:27 AM  

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