MARCOLA: exemplo pra quem?
Para o sociólogo polonês Zygmunt Bauman, Liberdade e Segurança são estados incompatíveis em suas plenitudes. Ao tempo em que a segurança impõe ao indivíduo restrições e controles de sua liberdade, gerando, em certo aspecto, opressões dos valores individuais em nome de assegurar o convívio social; a Liberdade exige maior desprendimento dos mecanismos de controle.
Nada mais preciso para identificar o estado de sítio instaurado em São Paulo. A população cerceada de sua liberdade mínima, ir e vir, frente à insegurança explícita, descobre por espelhamento a necessidade de intensificar ainda mais o controle como única saída para “voltar a ser livre”.
A situação atual serve também, em muitos aspectos, como reflexo do país. Enquanto o G8 e convidados discutem em São Petersburgo a tal nova ordem mundial e outros parâmetros comerciais que sustentem o capitalismo neoliberal, a desordem se estabelece por aqui em paradoxos trágicos para nossa história: um país dividido em dois poderes cujas capacidades e coerências são metáforas de suas lideranças.
De um lado um tráfico-terrorista orgulhoso de sua capacidade; do outro, um presidente que tem a leitura como mal-necessário tanto quanto o exercitar físico. Um bandido capaz de ameaçar com um simples gesto de silêncio; e um chefe-de-estado incapaz de explicações plausíveis - seja na área social, política ou econômica – preferindo comentar as decisões metaforizando sobre jogos de futebol.
Ora, um amigo me escreveu achar muito exibicionismo de Marcola. Concordo plenamente... Mas este é o marketing escolhido pelo traficante: certa “erudição”. E não deixa de ser curioso que seja este o instrumental para a construção de seu espetáculo. Como muito bem coloca Eugênio Bucci, a espetacularização do indivíduo é hoje condição determinante para sua existência política. Marcola se mostra preparado para o gerar e administrar o poder, faz-se figura pública horrível e respeitável, exercendo uma capacidade em conduzir politicamente os fatos digna dos mais preparados comandantes.
Os políticos brasileiros perdem pela ignorância ideológica. Não a desprovida de erudição, mas na própria capacidade em enxergar nossas condições e idiossincrasias. E a incapacidade de experimentarem outras possibilidades, permanecendo aprisionados em estruturas e ações arcaicas de pouca ou nenhuma valia.
Por que não permitir a Luiz Eduardo Soares desenvolver suas propostas de segurança pública, ao invés da atual política da negociação póstuma e paliativa com as lideranças criminais? Ou o Renda Básica de Cidadania, de Eduardo Suplicy, no lugar do paternalismo improdutivo do Fome Zero?
Por que Antônio Cândido, petista das origens, não é nosso Ministro da Cultura, já que este foi durante décadas o mentor de sua política cultural? Por que o projeto pedagógico-educacional de Paulo Freire nunca foi efetivamente colocado em prática pelo Governo Federal?
Para qual Brasil se administra os brasis, afinal?
Onde estão Sérgio Buarque de Hollanda, Câmara Cascudo, Darcy Ribeiro, Mário de Andrade, Gilberto Freire, Herbert de Sousa, Mário Pedrosa, Milton Santos?
Mortos! E mesmo os vivos, igualmente aprisionados nas estantes das livrarias e em mochilas de universitários... Mas nossos políticos acham os livros desnecessários, os intelectuais e estudiosos chatos, enfadonhos. E preferem agir de acordo com suas enormes capacidades perceptivas geradas em discursos escritos por redatores para os palanques esporádicos patrocinados sabe-se lá por quem.
Talvez Marcola tenha lido nossos autores. Isso explicaria a facilidade com a qual entende, manipula e reconfigura nossa sociedade de acordo com seus interesses. Resta-nos conviver com isso. Cada história gera seus próprios representantes. Se não sabemos escolher os nossos, eles se formam por si só.
O Brasil de hoje entra pela porta de emergência de uma UTI devidamente equipada com as melhores máquinas estrangeiras, sinalizando a todos, desesperado, a proximidade da falência múltipla de seus órgãos, enquanto desafiamos sua morte com intervenções de Ivo Pitanguy.
Contagem regressiva. Vem aí mais uma eleição!
__________
Nada mais preciso para identificar o estado de sítio instaurado em São Paulo. A população cerceada de sua liberdade mínima, ir e vir, frente à insegurança explícita, descobre por espelhamento a necessidade de intensificar ainda mais o controle como única saída para “voltar a ser livre”.
A situação atual serve também, em muitos aspectos, como reflexo do país. Enquanto o G8 e convidados discutem em São Petersburgo a tal nova ordem mundial e outros parâmetros comerciais que sustentem o capitalismo neoliberal, a desordem se estabelece por aqui em paradoxos trágicos para nossa história: um país dividido em dois poderes cujas capacidades e coerências são metáforas de suas lideranças.
De um lado um tráfico-terrorista orgulhoso de sua capacidade; do outro, um presidente que tem a leitura como mal-necessário tanto quanto o exercitar físico. Um bandido capaz de ameaçar com um simples gesto de silêncio; e um chefe-de-estado incapaz de explicações plausíveis - seja na área social, política ou econômica – preferindo comentar as decisões metaforizando sobre jogos de futebol.
Ora, um amigo me escreveu achar muito exibicionismo de Marcola. Concordo plenamente... Mas este é o marketing escolhido pelo traficante: certa “erudição”. E não deixa de ser curioso que seja este o instrumental para a construção de seu espetáculo. Como muito bem coloca Eugênio Bucci, a espetacularização do indivíduo é hoje condição determinante para sua existência política. Marcola se mostra preparado para o gerar e administrar o poder, faz-se figura pública horrível e respeitável, exercendo uma capacidade em conduzir politicamente os fatos digna dos mais preparados comandantes.
Os políticos brasileiros perdem pela ignorância ideológica. Não a desprovida de erudição, mas na própria capacidade em enxergar nossas condições e idiossincrasias. E a incapacidade de experimentarem outras possibilidades, permanecendo aprisionados em estruturas e ações arcaicas de pouca ou nenhuma valia.
Por que não permitir a Luiz Eduardo Soares desenvolver suas propostas de segurança pública, ao invés da atual política da negociação póstuma e paliativa com as lideranças criminais? Ou o Renda Básica de Cidadania, de Eduardo Suplicy, no lugar do paternalismo improdutivo do Fome Zero?
Por que Antônio Cândido, petista das origens, não é nosso Ministro da Cultura, já que este foi durante décadas o mentor de sua política cultural? Por que o projeto pedagógico-educacional de Paulo Freire nunca foi efetivamente colocado em prática pelo Governo Federal?
Para qual Brasil se administra os brasis, afinal?
Onde estão Sérgio Buarque de Hollanda, Câmara Cascudo, Darcy Ribeiro, Mário de Andrade, Gilberto Freire, Herbert de Sousa, Mário Pedrosa, Milton Santos?
Mortos! E mesmo os vivos, igualmente aprisionados nas estantes das livrarias e em mochilas de universitários... Mas nossos políticos acham os livros desnecessários, os intelectuais e estudiosos chatos, enfadonhos. E preferem agir de acordo com suas enormes capacidades perceptivas geradas em discursos escritos por redatores para os palanques esporádicos patrocinados sabe-se lá por quem.
Talvez Marcola tenha lido nossos autores. Isso explicaria a facilidade com a qual entende, manipula e reconfigura nossa sociedade de acordo com seus interesses. Resta-nos conviver com isso. Cada história gera seus próprios representantes. Se não sabemos escolher os nossos, eles se formam por si só.
O Brasil de hoje entra pela porta de emergência de uma UTI devidamente equipada com as melhores máquinas estrangeiras, sinalizando a todos, desesperado, a proximidade da falência múltipla de seus órgãos, enquanto desafiamos sua morte com intervenções de Ivo Pitanguy.
Contagem regressiva. Vem aí mais uma eleição!
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Eu havia acrescido aqui o texto, suposta entrevista com Marcola, (o qual repassei ingenuamente, como tantos devem ter feito). Mas não costumo ter outros autores blogados sem permissão ou comunicação. Sendo assim, retirei-o. Nos comentários há o link onde a crônica de Arnaldo Jabor pode ser encontrada. E mantenho o meu, pois minhas idéias continuam as mesmas... Com ou sem entrevista. Obrigado Paula pela correção!
6 Comments:
Alguma coisa está realmente, eu não diria errada, já que não há erro a/onde nunca houve acerto, mas que a sensação que temos ao perceber uma "erudição" "infiltrada" no crime beira o grotesco, não tenho dúvida. Enquanto isso, milhares não têm acesso à informações básicas; muitas vezes, ao alimento básico.
Talvez pessoas ligadas ao próprio G8, que pode se tornar G13 em breve, tenham explicações. Assim como a "manutenção" dos direitos de Beira-Mar, e de sua fortuna de 40 milhões, expliquem os gastos federais orçados em 16 mil reais/ mês para mantê-lo.
Saída? Solução? Só se houvesse um consenso geral do dia para a noite, um "quase milagre" de consciência coletiva.
Eu aguardo esse dia, por mais quixotesco que pareça, pq. não creio em um império que não rua no devido tempo.
Abraço
By Anônimo, at 7:04 AM
Oi Ruy,
Essa entrevista é um texto ficcional escrito por Arnaldo Jabor. Veja a história no site do Observatório da Imprensa.
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=387FDS002
Mas sem dúvida a "obra-texto" faz pensar. Afinal o Jabor usou a realidade para criar essa ficção.
Abraço,
Paula.
By Anônimo, at 7:14 AM
Eu quase acreditei. Mas Marcola citando Oiticica me pareceu um pouco
demais. Eu não tenho uma cópia original do Aspiro ao Grande Labirinto,
me viro com um xerox, como esse cara teria isso? Teria comprado o
catálogo na expo do Witte de With em 1992? Dá vontade de acreditar que
fosse verdade, isso é que é o mais interessante, porque a gente quer
acreditar em algum tipo de transformação gerada por idéias
intelectuais.
Beijos,
Paula.
By Anônimo, at 7:24 AM
oi ruy,
vc está ecoando a incrível lógica que diz que o pt é o verdadeiro responsável pelos erros cometidos por décadas de psdb em são paulo?!?
fernanda
By Anônimo, at 12:32 PM
Sinceramente? Não acho que era o momento do Jabor "brincar" com um lance sério desses. Todos que leram (eu mesma havia lido antes) acreditaram. Ainda que ele tenha feito uma crônica, e o povo extraído um trecho. Não acho que personagens como Marcola merecem tanta atenção. Há um sábio ditado que diz que quanto mais se fala no mal mais força se dá a ele. Enfim...
By Anônimo, at 1:35 PM
Resumo aqui o que respondi pra Fernanda.
Não é uma questão de CULPAR o PT, mas COBRAR ações. Não me importa qual o partido no comando, esta será sempre a minha postura.
Como lhe escrevi, quem assume um país assume sua história. Boas ou não. E tem de estar preparado para agir sobre suas contradições e mazelas em nome do bem-comum. Ainda que as ações não se consolidem e se finalizem em tentativas...
E relevar ou tornar mais branda a COBRANÇA por não ser culpa do governo em gestão, é igualmente ser culpado, por passividade e negligência. O PT se justifica com o 8 anos de PSDB, que se justifica com os anos Sarney/Itamar/Collor, que se justificam com as décadas de ditadura, que se justificava pela manutenção da democracia contra o comunismo reacionário da esquerda...
Ainda acredito no ideal esquerdista. Quanto ao PT, dúvidas e receios. Mas sem ele o que nos sobra? O PSDB pmdbista? É aí que a coisa toda enrosca! A escolha será nas urnas. Ou esses (um híbrido entre FHC e Sarney) ou PT pflista (algo entre Dirceu/ Lula e ACM). Parece que tudo se tornou uma coisa só.
Então esqueço rostos e siglas e cobro por hoje. Ninguém vai conseguir justificar ao violentado que o sofrimento dele é culpa de oito anos passados. Isso não apaga traumas ou morte. SOLUÇÕES E BOA-VONTADE! Não vejo nada disso no Governo atual (dane-se o partido em questão...). Só um insuportável oportunismo eleitoreiro. DE TODOS OS LADOS!
Beijo a todos
RUY FILHO
By Ruy Filho, at 4:10 PM
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