JEAN LUC LAGARCE: uma outra dramaturgia francesa
No folheto distribuído na entrada do Teatro Laboratório da ECA/USP, lê-se que o dramaturgo Jean Luc Lagarce chega efetivamente a Paris no final dos anos 80. Mas é na década seguinte que encenadores como Jean-Pierre Vicent, Alain Fromager, François Berruer, Philippe Delaigue, Philippe Sireuil, Stanislas Nordey, tornam-no um dos principais autores contemporâneos. Se Lagarce serve ao teatro francês como ponte à atualidade de uma linguagem dramática, também revela o potencial de outra leva de encenadores.
Na ECA assistimos Music-Hall, com encenação de François Berruer, e a portuguesa Cia. Artistas Unidos.
O texto sugere a decadência de um espetáculo de revista, pelas exigências nos diversos espaços nos quais se apresentara, a decadência do gênero e dos artistas, as dificuldades, o distanciamento e abandono do público. Sugere, pois Lagarce não trata a dramaturgia como pretexto para a narração saudosista ou mesmo a linearidade da memória emotiva. Com elaborada e complexa escrita, propõe ao espectador que imagine as situações e adversidades via descrições técnicas e espaciais da produção de cada apresentação, sempre acrescentando a cada nova descrição um maior grau de empobrecimento do tal espetáculo.
Enquanto a vedete narra as desventuras desses episódios - na tentativa de compreender junto aos dois outros atores/dançarinos que a acompanham no show, partindo da apresentação ideal até a mais medíocre -, a personagem se apronta para mais uma nova apresentação. Lagarce cria assim uma relação capaz de nos oferecer duas possibilidades ao mesmo instante: assistir ao Presente enquanto o mesmo nos ajuda a criar imagens do Passado que o sustenta.
Entretanto, o que poderia ser uma chave instigante, ganha uma montagem descuidada. A opção pelo palco desprovido de cenário não justifica a elaborada iluminação que tenta impor ao espetáculo um ritmo mais desenhado. Eficiente enquanto desenho, a luz termina por apagar o esvaziamento proposto na solidão dos personagens estabelecendo uma atmosfera mais construída a um grande show do que propriamente a sua decadência.
Caricatos, os atores igualmente não alcançam a capacidade do texto em serem múltiplos. Não há diferenciação entre decepção, passado, expectativa, sonho, desejo, ironia, simulação, dissimulação, medo, confronto com a realidade, saudosismo, lamento. Tudo está lá. A dramaturgia de Lagarce é repleta de caminhos e possibilidades, mas o que tão claramente existe aos ouvidos, não está aos olhos. E fica a sensação de algo mal realizado, escolar, ingênuo, onde as tônicas dominantes são a triangulação espacial repetitiva, ineficaz, e a excessiva utilização do proscênio para representar a quebra da quarta-parede. Artifícios óbvios e banais como este são esbanjados durante toda a apresentação.
De qualquer maneira, o texto de Lagarce existe e sobrevive. Difícil. Digno de um dramaturgo estimulante para qualquer novato que se interesse pela escrita dramática e seus percalços técnicos. Raro, necessário. Capaz de olhar o que há de mais urgente à sobrevivência do mundo contemporâneo: a sensibilização de si mesmo pelas pequenas ações do cotidiano descontituido de romantismo. Enfim, solitário poeta de tempos tristes...
Na ECA assistimos Music-Hall, com encenação de François Berruer, e a portuguesa Cia. Artistas Unidos.
O texto sugere a decadência de um espetáculo de revista, pelas exigências nos diversos espaços nos quais se apresentara, a decadência do gênero e dos artistas, as dificuldades, o distanciamento e abandono do público. Sugere, pois Lagarce não trata a dramaturgia como pretexto para a narração saudosista ou mesmo a linearidade da memória emotiva. Com elaborada e complexa escrita, propõe ao espectador que imagine as situações e adversidades via descrições técnicas e espaciais da produção de cada apresentação, sempre acrescentando a cada nova descrição um maior grau de empobrecimento do tal espetáculo.
Enquanto a vedete narra as desventuras desses episódios - na tentativa de compreender junto aos dois outros atores/dançarinos que a acompanham no show, partindo da apresentação ideal até a mais medíocre -, a personagem se apronta para mais uma nova apresentação. Lagarce cria assim uma relação capaz de nos oferecer duas possibilidades ao mesmo instante: assistir ao Presente enquanto o mesmo nos ajuda a criar imagens do Passado que o sustenta.
Entretanto, o que poderia ser uma chave instigante, ganha uma montagem descuidada. A opção pelo palco desprovido de cenário não justifica a elaborada iluminação que tenta impor ao espetáculo um ritmo mais desenhado. Eficiente enquanto desenho, a luz termina por apagar o esvaziamento proposto na solidão dos personagens estabelecendo uma atmosfera mais construída a um grande show do que propriamente a sua decadência.
Caricatos, os atores igualmente não alcançam a capacidade do texto em serem múltiplos. Não há diferenciação entre decepção, passado, expectativa, sonho, desejo, ironia, simulação, dissimulação, medo, confronto com a realidade, saudosismo, lamento. Tudo está lá. A dramaturgia de Lagarce é repleta de caminhos e possibilidades, mas o que tão claramente existe aos ouvidos, não está aos olhos. E fica a sensação de algo mal realizado, escolar, ingênuo, onde as tônicas dominantes são a triangulação espacial repetitiva, ineficaz, e a excessiva utilização do proscênio para representar a quebra da quarta-parede. Artifícios óbvios e banais como este são esbanjados durante toda a apresentação.
De qualquer maneira, o texto de Lagarce existe e sobrevive. Difícil. Digno de um dramaturgo estimulante para qualquer novato que se interesse pela escrita dramática e seus percalços técnicos. Raro, necessário. Capaz de olhar o que há de mais urgente à sobrevivência do mundo contemporâneo: a sensibilização de si mesmo pelas pequenas ações do cotidiano descontituido de romantismo. Enfim, solitário poeta de tempos tristes...
3 Comments:
pancho joão gordo pergunta: foi melhor ou pior que ´a pedra no rim´?
By Anônimo, at 9:04 AM
PANCHO
Risos... Você odiou mesmo o Antunes!
Mas são duas coisas completamente diferentes. No Antunes havia uma preocupação estética e pesquisa de linguagem em relação ao ator e a cena. Na montagem de Berruer, simplesmente não havia nada...
Assisti ao lado do Damasceno, que em muitos momentos chegou a reclamar da falta de verdade das cenas. Saímos os dois simplesmente sem entender o que de importante havia nessa montagem. Frustrados.
Sobre o Antunes, ainda vou escrever aqui.
Beijos
By Ruy Filho, at 3:04 PM
hummmm imaginei mesmo sobre o Tal Lagarce...
na época de França me lembro qde um amigo não falar nada bem dele...
Nada como Maguy Marin, Jerome Bel e Théâtre du Radeau.
E quanto a "Pedra nos Rins"? como assim Pancho! ahaha
pelo menos o Lee Taylor tá bem???
Beijinhos Thaís
tentando voltar a ver teatro, mas com muita cautela. É tanta que até complica....
By Anônimo, at 5:21 PM
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