ROXO: entre a mudez e o silêncio
Muito há o que ser dito e entendido no silêncio. A respiração de quem aguarda, a grandiosidade transformada de cada mínimo gesto, um olhar que seja. Tudo assume outra feição e desperta uma espécie de embriaguez lúcida.
Em Roxo, texto de Jon Fosse, o silêncio é arma dramatúrgica. A simples história de garotos que decidem formar uma banda sem serem músicos ou saberem tocar, misturada a dificuldade própria da juventude em abordar as relações e emoções, expande possibilidades interessantes na forma como o autor constrói os diálogos e principalmente as faltas deles.
Feitas em sua grande maioria por perguntas, as falas fogem do óbvio com a estratégia de compor respostas curtas e dúbias, muitas vezes confundindo a quais questões se referem. E nesse espaço conflituoso, o silenciar dos personagens acrescenta drama e solidão.
Fosse cria um olhar no espelho sobre a perda de nossa capacidade em se comunicar uns com os outros. Como se estivéssemos nos afastando de nós mesmos frente a um vazio construído, não-natural, mas presente e constituinte de nossas almas.
Há a tristeza de se reconhecer nesse vazio em uma época em que o excesso estabelece a perda de identidade e a mídia conduz o imaginário à escassez dos instrumentos de criação e percepção.
Em artigos recentes, pesquisadores afirmaram que estamos ouvindo cada vez menos devido à quantidade de sons sobrepostos e a péssima qualidade desses ruídos. Roxo vai pelo mesmo caminho. E metaforiza com o silêncio como seu maior diálogo, afirmando estarmos igualmente incapazes de nos comunicar graças à futilidade e agressividade de nossos argumentos.
O espetáculo, em cartaz no Espaço dos Satyros, com direção de Fernanda D´Umbra, curiosamente reflete tudo isso. Não pelos acertos em si, mas pela imaturidade do jovem elenco. Não há aproveitamento do silêncio, das contradições e medos, da falta do que e como dizer.
Em ritmo constante, quebrados por momentos de confrontos gritados, a montagem patina sobre o ritmo enquanto esfacela a narrativa e dubiedade pela qual se justifica. Tímida, inconstante, a direção acaba por trazer à cena muito pouco.
O curioso, em si, fica na própria metáfora de como também o acabamento e técnica no teatro estão sendo submetidos ao favorecimento de projetos casuais. Também o teatro sofre a perda de seu discurso em realizações superficiais quase sempre por culpa da falta de tempo e pesquisa.
Muitos são os eventos e projetos atuais elaborados em meio a pressa do fazer, da urgência mercadológica. E tal estratégia, cada vez mais aplaudida pelos governos e comissões, está de alguma maneira determinando esse vocabulário como o correto, confundindo a estética do casual com produções pobres, sem profundidade e voltadas ao novo entretenimento cult do "alternativo". Engano duplo, pois nem alternativo e tampouco cult, ao fim, tais propostas se revelam.
É preciso recuperar o valor da cena, da imaginação, do ator, da técnica, para que tenhamos novamente o teatro em sua real potencialidade. Ou estaremos, como estamos, cada vez mais próximos de recriar o próprio mistério do silêncio que se forma entre o público, porém sem metáforas e contextos, apenas o vazio de não saber falar.
Em Roxo, texto de Jon Fosse, o silêncio é arma dramatúrgica. A simples história de garotos que decidem formar uma banda sem serem músicos ou saberem tocar, misturada a dificuldade própria da juventude em abordar as relações e emoções, expande possibilidades interessantes na forma como o autor constrói os diálogos e principalmente as faltas deles.
Feitas em sua grande maioria por perguntas, as falas fogem do óbvio com a estratégia de compor respostas curtas e dúbias, muitas vezes confundindo a quais questões se referem. E nesse espaço conflituoso, o silenciar dos personagens acrescenta drama e solidão.
Fosse cria um olhar no espelho sobre a perda de nossa capacidade em se comunicar uns com os outros. Como se estivéssemos nos afastando de nós mesmos frente a um vazio construído, não-natural, mas presente e constituinte de nossas almas.
Há a tristeza de se reconhecer nesse vazio em uma época em que o excesso estabelece a perda de identidade e a mídia conduz o imaginário à escassez dos instrumentos de criação e percepção.
Em artigos recentes, pesquisadores afirmaram que estamos ouvindo cada vez menos devido à quantidade de sons sobrepostos e a péssima qualidade desses ruídos. Roxo vai pelo mesmo caminho. E metaforiza com o silêncio como seu maior diálogo, afirmando estarmos igualmente incapazes de nos comunicar graças à futilidade e agressividade de nossos argumentos.
O espetáculo, em cartaz no Espaço dos Satyros, com direção de Fernanda D´Umbra, curiosamente reflete tudo isso. Não pelos acertos em si, mas pela imaturidade do jovem elenco. Não há aproveitamento do silêncio, das contradições e medos, da falta do que e como dizer.
Em ritmo constante, quebrados por momentos de confrontos gritados, a montagem patina sobre o ritmo enquanto esfacela a narrativa e dubiedade pela qual se justifica. Tímida, inconstante, a direção acaba por trazer à cena muito pouco.
O curioso, em si, fica na própria metáfora de como também o acabamento e técnica no teatro estão sendo submetidos ao favorecimento de projetos casuais. Também o teatro sofre a perda de seu discurso em realizações superficiais quase sempre por culpa da falta de tempo e pesquisa.
Muitos são os eventos e projetos atuais elaborados em meio a pressa do fazer, da urgência mercadológica. E tal estratégia, cada vez mais aplaudida pelos governos e comissões, está de alguma maneira determinando esse vocabulário como o correto, confundindo a estética do casual com produções pobres, sem profundidade e voltadas ao novo entretenimento cult do "alternativo". Engano duplo, pois nem alternativo e tampouco cult, ao fim, tais propostas se revelam.
É preciso recuperar o valor da cena, da imaginação, do ator, da técnica, para que tenhamos novamente o teatro em sua real potencialidade. Ou estaremos, como estamos, cada vez mais próximos de recriar o próprio mistério do silêncio que se forma entre o público, porém sem metáforas e contextos, apenas o vazio de não saber falar.
5 Comments:
Caro Ruy:
Muito bacanas suas colunas. Num universo onde a fazeção de média impera, com os críticos cada vez mais amiguinhos dos diretores naquela afetividade que não deixa ninguém aprofundar nenhum tipo de análise, é muito reconfortante ler algo como a sua coluna sobre a peça Roxo. Concordo contigo. O despojamento tá se confundindo com superficialidade na cena cultural de São Paulo. Isso tá virando um padrão perigoso, pouco apontado pela imprensa "especializada" que no momento só enaltece esse "boom" de grupos e produções alternativas, sem apontar a imaturidade dos elencos, diretores e dramaturgos.
parabéns, meu velho
By Anônimo, at 1:52 PM
Leonardo Cortez,
O mais para mim é tentar criar uma distância que me possibilite ir além das minhas primeiras impressões. Claro que envolve um estado físico e emocional do momento, assim como também dos atores. Mas acredito que a avaliação crítica de um trabalho deve ser realizada em tempo real.
A imprensa, de modo geral, está enforcada em compromissos comerciais. Isso é um fato. E a coisa piora com os "relevar" da vida.
Sempre que escrevo uma crítica tento criar duas coisas:
1. me imaginar do outro lado. E então ter um texto que de fato esclareça meu ponto de vista para que possa ajudar o artista em sua criação. Pois muitas vezes é bem complicado conseguir esse olhar de fora estando dentro do processo. Também tenho essa dificuldade com os meus trabalhos e entendo ser o crítico a figura mais propícia para trazer essa percepção.
2. Deixar ao leitor uma abordagem que vá além da mera crítica técnica e do gostei ou não.
Se consigo isso, de alguma maneira, fico satisfeito. Respostas pontuais como a sua, valem a tentativa de romper os esquemas que se estabeleceram por aí!
Abraços,
RUY FILHO
By Ruy Filho, at 2:00 PM
Mt bom seu blog e seus textos. Te ad. pra poder voltar sempre. Abraço.
By Mariane Monteiro, at 3:29 PM
Oi Mariane, seja bem-vinda ao Antro. Passo em breve no seu blog, então trocamos algumas idéias.
Beijos
RUY FILHO
By Ruy Filho, at 3:43 PM
A falta de paciência e tempo no momento de criação, tanto no cinema como no teatro é o grande vilão dessa história.
As pessoas acham que Casavette, Bukovsky...entre outros...criam suas obras em ´one take´. Na verdade...os caras fazem 3000 vezes exatamente para PARECER amador.
abraço Rui
Pancho
By Anônimo, at 11:06 AM
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